Lic. Intercultural - 6 - Bases Legais

Licenciatura Intercultural

6 - Bases Legais

A proposta de licenciatura específica para professores indígenas está amparada na Constituição Federal, que estabelece um novo quadro de relações do Estado com os povos indígenas, reconhecendo-lhes o direito de sua organização, de sua manifestação lingüística e cultural e de seu modo de viver segundo os seus próprios projetos societários. Os indígenas passaram a ter direito a uma educação específica, diferenciada e intercultural, conforme o previsto nos Artigos 210 e 215:

Art. 210 - O ensino fundamental regular será ministrado em língua portuguesa, assegurada às comunidades indígenas também a utilização de suas línguas maternas e processos próprios de aprendizagem.(...) Art. 215 - O Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos particulares do processo civilizatório nacional. O texto constitucional rompeu, portanto, com a política integracionista de homogeneização cultural e étnica e estabeleceu um novo paradigma com base no pluralismo cultural, no qual se insere o direito a uma educação escolar específica. Garante o respeito aos seus processos próprios de aprendizagem, inclusive assegurando que o ensino seja feito na língua materna dos índios, como meio de comunicação e aprendizagem.

Com a Lei de Diretrizes e Bases, no. 9.394, de 1996, definiu-se como dever do Estado com a colaboração do Ministério da Cultura e órgão federal indigenista a oferta de uma educação escolar bilíngüe e intercultural, com o objetivo de fortalecer as práticas socioculturais e a língua materna dos povos e comunidades indígenas, bem como lhes assegurar o acesso aos conhecimentos técnico- científicos da sociedade não-indígena.

Art. 78. O Sistema de Ensino da União, com a colaboração das agências federais de fomento à cultura e de assistência aos índios, desenvolverá programas integrados de ensino e pesquisa, para oferta de educação escolar bilíngüe e intercultural aos povos indígenas, com os seguintes objetivos: I - proporcionar aos índios, suas comunidades e povos, a recuperação de suas memórias históricas; a reafirmação de suas identidades étnicas; a valorização de suas línguas e ciências; II - garantir aos índios, suas comunidades e povos, o acesso às informações, conhecimentos técnicos e científicos da sociedade nacional e demais sociedades indígenas e não-índias. Para que essa política seja cumprida, a Lei assegura que a União apóie técnica e financeiramente o desenvolvimento da educação e determina que haja a articulação dos sistemas de ensino para a elaboração de programas integrados de ensino e pesquisa, os quais deverão ser construídos com a participação dos indígenas. Art. 79. A União apoiará técnica e financeiramente os sistemas de ensino no provimento da educação intercultural às comunidades indígenas, desenvolvendo programas integrados de ensino e pesquisa. § 1º Os programas serão planejados com audiência das comunidades indígenas. § 2º Os programas a que se refere este artigo, incluídos nos Planos Nacionais de Educação, terão os seguintes objetivos: I - fortalecer as práticas sócio-culturais e a língua materna de cada comunidade indígena; II - manter programas de formação de pessoal especializado, destinado à educação escolar nas comunidades indígenas; III - desenvolver currículos e programas específicos, neles incluindo os conteúdos culturais correspondentes às respectivas comunidades; IV - elaborar e publicar sistematicamente material didático específico e diferenciado.

As Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Escolar Indígena foram aprovadas em 14/09/1999, por meio do Parecer 14/99 da Câmara Básica do Conselho Nacional de Educação. Esse parecer institui as diretrizes que cria a categoria de escola indígena, a definição de competência para a oferta da educação escolar indígena, a formação do professor indígena, o currículo da escola indígena. Essas questões estão normatizadas na resolução nº 3/99.

A Resolução nº 03 / CEB-CNE[2], de 1999, estabelece “no âmbito da educação básica, a estrutura e o funcionamento das Escolas Indígenas, reconhecendo-lhes a condição de escolas com normas e ordenamento jurídico próprios, e fixando as diretrizes curriculares do ensino intercultural e bilíngüe, visando à valorização plena das culturas dos povos indígenas e à afirmação e manutenção de sua diversidade étnica” (artigo 1º). Vale lembrar que a formação e a habilitação dos professores indígenas, inclusive no Ensino Superior, é um pré-requisito para que se assegure o cumprimento desta Resolução.

Para melhor confirmar esse ponto de vista, podem-se destacar alguns dos principais pontos nessa Resolução:

(a) criação da categoria escola indígena, reconhecendo-lhe “a garantia de escolas com normas e ordenamento jurídico próprios”;
(b) garantia de uma formação específica para seus professores indígenas podendo esta ocorrer em serviço e, quando for o caso, concomitantemente com a sua própria escolarização;
(c) definição precisa das esferas de competência, em regimes de colaboração, entre União, Estados e Municípios. À primeira cabe legislar, definir diretrizes, e políticas nacionais, apoiar técnica e financeiramente os sistemas de ensino para provimento de programas de educação intercultural e de formação de professores indígenas, além de criar programas específicos de auxílio ao desenvolvimento da educação. Aos Estados caberá a responsabilidade “pela oferta e execução da educação escolar indígena, diretamente ou por regime de colaboração com seus municípios”, integrando as escolas indígenas como “unidades próprias, autônomas e específicas no sistema estadual” e provendo-as com recursos humanos, materiais e financeiros, além de instituir e regulamentar o magistério indígena.

Vale também mencionar o Plano Nacional de Educação (PNE), que foi sancionado por meio da Lei nº 10.172, de 09 de janeiro de 2001. Nele há um capítulo específico para a educação escolar indígena. Destacam-se alguns itens importantes, dentre os quais, aqueles referentes à formação dos professores indígenas, conforme pode ser verificado em algumas das metas estabelecidas no PNE em questão:

(...) 16. Estabelecer e assegurar a qualidade de programas contínuos de formação sistemática do professorado indígena, especialmente no que diz respeito aos conhecimentos relativos aos processos escolares de ensino-aprendizagem, à alfabetização, à construção coletiva de conhecimentos na escola e à valorização do patrimônio cultural da população atendida.

17. Formular, em dois anos, um plano para a implementação de programas especiais para a formação de professores indígenas em nível superior, através da colaboração das universidades e de instituições de nível equivalente. (...)

 

A meta 17, cujo prazo de cumprimento já venceu, garante uma das bases para que as escolas indígenas funcionem dentro dos parâmetros que prevê a legislação da EEI, ou seja, formar e habilitar os professores indígenas para exercer o magistério em suas comunidades. A proposta da licenciatura atende ainda a Convenção 169 da OIT na qual o Brasil é signatário. Essa convenção assegura aos povos indígenas o direito de adquirir uma educação em todos os níveis em pé de igualdade com o resto da comunidade nacional. Diretos consolidados no Decreto do Presidente da República, nº 5.051, de 19 de abril de 2005.

Para que a União implemente esta política e alcance as metas estabelecidas em lei, é necessário o apoio das universidades públicas, particularmente das federais, pois nessas instituições estão os pesquisadores que atuam nas áreas indígenas. A UFG, por exemplo, possui em seu quadro mais de 20 professores doutores, cujas teses têm como objeto de estudo as populações indígenas. São trabalhos nas áreas de Lingüística, História, Antropologia, Geografia, Arte, Biologia, Matemática, etc.

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