cronica

Crônicas de escritor: Ariana Lobo

Quando eu era criança, ao final de uma aula de português, fui, timidamente, até a professora. Ela, ao notar minha presença amuada na quina da mesa, me olhou com um cansaço tão intenso que extrapolava os limites do corpo (olhar, inclusive, que apenas fui capaz de entender verdadeiramente anos depois, quando adulta, professora e igualmente cansada). Mas, mesmo assim, ela se colocou à disposição para me ouvir, em um nítido esforço de se mostrar receptiva, talvez esperando que eu tirasse uma dúvida sobre a matéria.

Acontece que eu fiz uma pergunta que de tão inusitada a lançou fora de seu estado de apatia. Eu, com toda a simplicidade e inocência típicas da infância, perguntei: “você acredita no potencial de uma garota assim como eu?”. Ao ouvir essa pergunta, o semblante dela se abriu e, com um sorriso de ternura, me respondeu: “mas é claro!”. Eu, não satisfeita, completei: “é que eu vou ser uma escritora quando eu crescer”. Então ela me presenteou com palavras de incentivo e com mais sorrisos de ternura, ao que fui embora satisfeita.

O fato é que eu não faço a menor ideia do porquê eu fiz isso. Eu simplesmente não sei o que me fez levantar da cadeira naquele dia e ir até a professora dizer algo que, até então, eu nunca havia pensado sobre. Na época eu não escrevia e não tinha nenhuma consciência a respeito do que iria escolher como profissão no futuro. Eu levantei e falei com ela como se não estivesse no domínio do meu corpo e, fazendo isso, sem saber, tracei meu futuro.

Os anos foram passando e comecei a escrever coisas que chamava de poesia. Cheguei até a atormentar outros professores de português com alguns textos (coitados) que eles se sentiram na obrigação de elogiar. Mas foi somente após entrar na faculdade de Letras que a escrita se fez em mim, e eu me fiz por meio dela. As aulas de Literatura se tornaram minha parte favorita da semana. E, com a supervisão do meu então orientador, Jamesson Buarque, aos poucos, fui evoluindo e me encontrando melhor como escritora. Jamesson me apresentou nomes como Micheliny Verunschky e Wesley Peres, que também me deram suporte, apoio e muitas dicas que eu fui internalizando, testando e adaptando ao meu recém descoberto estilo pessoal.

Depois fui criando autonomia e segurança, e me aventurei em meus projetos pessoais, como o #poesiapraversecola, no qual espalho lambes pela cidade com trechos de poemas maiores meus. Também fui convidada para dar algumas oficinas de escrita literária, uma delas, inclusive, no IFG de Goiânia. E, coincidentemente ou não, hoje trabalho como editora de livros. Todos os dias o meu ofício perpassa pela criação e elaboração de livros literários voltados para o público infantil e jovem. Mas fora do horário comercial o trabalho continua, pois os meus projetos pessoais se multiplicam e se avolumam a cada dia mais. Posso dizer que hoje eu vivo pela Literatura e para a Literatura. Tenho uma coleção de 8 livros voltada para o público infantil e meu primeiro livro de poesia, intitulado Manual do fim, já tem data prevista para a publicação pela Editora Martelo. Outros livros também estão tomando forma, aos poucos, no seu tempo. E estão vindo.

A cada dia que passa, a minha certeza de que meu destino é a literatura só se intensifica. E olha, ter a oportunidade de me formar como profissional na Faculdade de Letras da UFG foi um dos maiores presentes que a Ariana menina, lá naquela aula de português do passado, não poderia sequer imaginar. E é engraçado pensar agora que mesmo sem nenhuma evidência, ela já sabia.

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Ariana Lobo é licenciada em português e bacharela em literatura pela Universidade Federal de Goiás, especialista em Ensino de Literatura e mestre em Estudos Literários, também pela UFG. Poeta e contista, atua como editora de livros em uma editora da capital goiana. Autora do livro de poemas Manual do fim, com previsão de lançamento no primeiro semestre de 2024.